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Caros reis e senhores Metallica, vocês é que são brutais

E ao terceiro dia do NOS Alive chegaram os quatro "masters" para soltar a fúria metaleira no recinto. Fúria, gratidão e fogo de artifício.

Caros reis e senhores Metallica, vocês é que são brutais

Os Metallica soltaram a fúria, o amor (aos fãs e uns aos outros) e labaredas. Uma série de labaredas a somar aos solos incendiários e à temperatura alta que ferveu o Passeio Marítimo de Algés. Foi o regresso dos "monstros" ao festival, depois de terem figurado no cartaz de 2009. Foi também o último concerto da digressão pela Europa e, pelo que nos disseram, o público que ali estava terá conquistado o título de campeão no campeonato "quem rocka mais em solo europeu a ver os Metallica".

James Hetfield, Kirk Hammett, Lars Ulrich e Robert Trujillo chegaram a Portugal artilhados com um set que, sem clemência, serviram magistralmente de rajada. 17 malhas que foram buscar à discografia que já passou os redondos 40 - e que hoje foi saudada em glória.

O poderoso alinhamento culminou no estrondo ao vivo - Master Of Puppets - que, por estes dias, tem disparado nas plataformas de streaming por ter sido usado numa das cenas (épica, por sinal) da série norte-americana Stranger Things. Até Robert Trujillo veio vestido com uma t-shirt alusiva à série da Netflix. Para sermos mais precisos, era uma peça de merchandising do chamado clube Hellfire, liderado pela personagem Eddie Munson, o jovem metaleiro que protagoniza a tal cena no último episódio da quarta temporada.

Mas adiante. Bons olhos vejam os Metallica. Imponentes no posto senhorial do rock pesado e homens que sobreviveram à tragédia e aos problemas reincidentes de dependência de Hetfield que, esta noite, esteve, acima de tudo, grato. Vimos um homem grato aos três companheiros e aos fãs ("amigos dos Metallica") - os que não arredam pé do quarteto, aconteça o que acontecer. 

A última vez que a banda passou por cá foi em 2019 quando atuou no Estádio do Restelo. Entretanto, o mundo ficou do avesso, devido ao infortúnio virulento, e James Hetfield voltou aos cuidados da reabilitação (que levou à interrupção dessa mesma digressão). Três anos passaram e eis que voltámos aos mesmos postos. Os Metallica voltaram aos palcos, James Hetfield voltou ao serviço e nós voltámos à feliz condição de espectadores.
         
Aos poucos, a família (numerosa) Metallica foi preenchendo os espaços vazios no amplo recinto, até não caber nem uma palheta. Mentira. Palhetas cabiam e foram distribuídas pela banda aos que ocupavam as linhas da frente. Diz a organização que estiveram cerca de 55 mil pessoas em Algés. 

Pouco depois das onze da noite, ouviu-se a "senha" de entrada do grupo, depois de rodar nas colunas 'It's a Long Way to the Top (If You Wanna Rock n' Roll)', dos AC/DC. 'Ecstasy of Gold', que Ennio Morricone criou para o western "O Bom, o Mau e o Vilão", - teve um batalhão de vozes a trautear a melodia que, como é costume, abre os concertos dos norte-americanos. Os braços frenéticos de Lars Ulrich manobrar a bateria e os primeiros sons que sairam das guitarras de Hetfield e de Hammett injetaram a primeira leva de adrenalina no público que, por esta altura, tinha percebido que vinha aí o desvairado 'Whiplash', uma das faixas do disco de estreia "Kill 'Em All" e malha que apela descaradamente ao headbanging. James Hetfield, Kirk Hammett e Robert Trujillo assumiram as posições no palco, enquanto dedilhavam, também eles frenéticos, as guitarras e o baixo, respetivamente. Rock em carne viva. Dá gosto. 


Transição para 'Creeping Death' e para o riso malandro de James Hetfield. "Este homem tem cá uma pinta", ouvimos a menina que estava ao nosso lado a dizer, enquanto os quatro músicos se atiravam aos instrumentos como gente grande - que são. Logo a seguir, a introdução de Enter Sandman, do trintão The Black Album, espraiou-se pelo recinto, provocando frenesim por onde passava. Cantoria em massa, claro, e Lars Ulrich, sentado na bateria que estava na língua de palco, entusiasmado, a gritar para o infinito (alguém que lhe passe o microfone). 

"Lisboaaaaaaaaaaa", gritou Hetfield. "Estão bem? Nós também estamos bem. É bom ver a família Metallica", disse ainda, antes de se atirar a 'Cyanide', com os companheiros. Os quatro continuam a ser putos irrequietos - James, Kirk e Robert estão em constante movimentação no palco e Lars continua inquieto na bateria. A entrega dos quatro aos instrumentos (e ao concertão que deram) foi irrepreensível. Chegou a ser comovente. 'Wherever I May Roam' abriu caminho - mesmo a abrir - à baladona 'Nothing Else Matters' - um dos poucos momentos serenos, com Hammett a fazer a sua magia à guitarra, embebido num belo fundo azul.

"É o último espetáculo da digressão de 2022 pela Europa", explicou James Hetfield. "Quero agradecer-vos por estarem cá, por apoiarem a música mais pesada. E quero agradecer aos amigos dos Metallica", continuou a voz do grupo de São Francisco que agradeceu também à equipa que os acompanha na estrada. As últimas palavras de gratidão ficaram reservadas ao trio que o completa. "Obrigado por serem vocês", acrescentou Hetfield, que parecia francamente comovido.

O alinhamento seguiu com 'Dirty Window', 'Whiskey in the Jar', 'For Whom the Bell Tolls' e 'Moth Into Flame' que serviu de combustível para lançar uma série de chamas nas zonas laterais do palco e, já agora, "incendiar" o campo de ação de Lars, que entretanto tinha ido para outra bateria, posicionada mais atrás. 

"Vocês estão a sentir?", perguntou Hetfield. "Eu estou a sentir. Sentem o que eu sinto. Não estão sozinhos", confidenciou o músico que, sinceramente, esta noite merecia um abraço apertado.

O poderoso 'Seek & Destroy' foi... poderoso até ao encore. Os Metallica voltaram poucos momentos depois e parecia que não queriam sair dali. 'Damage, Inc.' abriu a tríade do grande final e alinhou James, Kirk e Robert no palco. Os colossais 'One' e 'Master of Puppets' provocaram réplicas do mosh pit em vários pontos do recinto. 

No fim, houve uma chuvada de fogo de artifício - espetáculo pirotécnico que James Hetfield ficou a apreciar, parado, a olhar para cima - tal como nós. Aliás, ficaram todos por ali, a dar quase tudo o que tinham à mão, a começar pelas palhetas e a terminar no afeto pela família Metallica que, uma vez mais, não faltou ao encontro.

Mas há mais. Quando pensávamos que já não íamos ouvir mais a voz de James Hetfield, o músico foi ao microfone para chamar quem já estava a sair daquela zona do recinto. "Cucu", disse, mas com a versão americana da expressão, achamos nós. "Nós adoramos-vos", insistiu, antes de deixar o microfone para os restantes. Lars Ulrich gabou o público que estava à beira do Tejo. O baterista afiançou-nos que, depois deste concerto, era claro que tinham deixado o melhor para o fim. Da boca de Robert Trujillo - que gritou em português - ouviu-se: "vocês são brutaaaaaaais". Não, Metallica, vocês é que são brutais. Masters!