Ainda não tem a nossa APP? Pode fazer o download aqui.

Florence + The Machine no NOS Alive: a noite para espantar todos os males

Segundo dia do NOS Alive com a "intervenção divina" de Florence Welch.

Florence + The Machine no NOS Alive: a noite para espantar todos os males
Florence + The Machine no NOS Alive 2022/Rúben Viegas

É impossível não salientar a forte presença feminina desta noite no palco NOS. Ver a reportagem do jornalista Gonçalo Palma. Vimos a alma a escorrer nas vozes de Celeste e de Jorja Smith que antecederam a purga dançante de Florence Welch - a britânica que chegou ao palco dentro de um esvoaçante vestido vermelho. E descalça, como é costume.

Florence, que transforma os demónios em substância artística e os atropelos da existência em canções, levou-nos para dentro do "culto Florence + The Machine", designação da própria.

A estética desse lugar de Welch lembra o sobrenatural/fantástico, mas, parece-nos, é afinal um lugar que tem tanto de etéreo como de terreno. Talvez como a humana Florence que personifica, ao detalhe, a ambivalência desse enclave purgatório. No palco, completada pela máquina instrumental de cinco músicos, exorciza, emociona-se e mete-nos a dançar, de bem com a vida e os seus dilemas terrestres.  

"Dance Fever" - o disco mais recente e o quinto da discografia - ocupou parte do alinhamento, mas a intenção foi a de rodar pelos outros álbuns e recuperar uma série de canções mais vividas - a grande maioria (ou talvez todas) ainda na ponta da língua dos milhares que se reuniram defronte ao palco - ou altar desse tal culto florenciano.  

A percussão dramática de 'Heaven Is Here', tema do último álbum, abriu o concerto. Foi quando ouvimos a voz poderosa e convicta de Florence Welch e seguimos-lhe os movimentos que, mesmo furiosos, nunca perdem a graciosidade. Seguiu-se 'King', mais uma cartada do novo disco e canção que pôs a artista inglesa a andar de um lado ao outro do palco, agora com o drama concentrado no olhar que fintava o público. 

Transição direta para 'What Kind Of Man' - retirada do álbum "How Big, How Blue, How Beautiful" - e para o acelerado 'Kiss With a Fist' que começou com a respiração ofegante de Florence e, mais à frente, a meteu a pular. 


"Muito obrigada", disse, por fim, aos milhares de devotos que tinha à frente. "Soltem tudo o que têm aí dentro", pediu depois com o sorriso delicado e o olhar cintilante. Veio 'Free', a canção (mais uma de "Dance Fever") que cumpre o desígnio de liberdade e que pôs na prática o que apregoa. "When I'm dancing, I'm Free/Quando estou a dançar sou livre", canta, às tantas, a esguia e tremendamente carismática ruiva. Ela que canta, dança e nos liberta. É que se os males de quem ali estava não tivessem sido espantados com 'Free', seriam espantados logo a seguir com 'Dog Days Are Over'.

O momento de conexão humana, sem aparelhos tecnológicos (que pode parecer um pouco vintage), teve de ser feito com concentração e entrega. Florence Welch, usando o clássico e quase sempre infalível humor britânico, pediu a todos para que guardassem os telemóveis e que aproveitassem o momento para fazer declarações de afeto a quem tinham ao lado. Usou o pretexto de ser um ritual do culto e assim foi, por breves momentos.

A euforia da faixa, que foi repescada de 'Lungs', acalmou com 'June' e 'Dream Girl Evil' foi o tema que Florence escolheu para descer até junto dos que estavam colados ao gradeamento. Cantou para eles, olhos nos olhos. Estendeu-lhes a mão. 

Seguiram-se 'Ship To Wreck', 'Cosmic Love' e 'My Love'. Em 'Big God', a cantora voltou a descer para junto do público, encostando-se aos que estavam mais perto. Já próximo do final, ouviu-se 'Spectrum' e, logo depois, a emotiva 'Never Let Me Go' - canção que estava guardada há cerca de uma década e que foi agora resgatada para brilhar ao vivo.  "Já não tocamos esta canção há cerca de dez anos. Lembra-me quando eu era nova, triste e alcoólica", confessou-nos Florence que está sóbria há uns bons anos. "Parei de ouvi-la, mas vocês não. Deram-lhe outro significado e ajudaram-me a voltar a gostar da música. Se vieram para cá tristes e alcoolizados, espero que agora estejam apenas alcoolizados", rematou, com graça.

'Hunger' foi até ao encore, que teve os indispensáveis 'Shake It Out' e 'Rabbit Heart (Raise It Up)' - que só não culminaram numa experiência de absoluto êxtase porque assim foi ao longo de todo o concerto. 

Culto? Talvez não, mas certo é que, ao longo de quase duas horas, os males foram espantados para bem longe. 

Mas houve mais coisas a acontecer no palco principal. 'Bane', faixa que abre o mais recente The Dream, abriu o concerto dos alt-J, assíduos nos palcos portugueses e um nome recorrente no cartaz de Algés. É a quarta vez que atuam no festival. Depois da catarse de Florence Welch, o trio britânico subiu ao palco para mostrar as novidades aos fãs que se mantiveram firmes a seus pés.

O alinhamento teve canções novas e outras mais antigas, para um belo exercício nostálgico, com 'Matilda' ou 'Breezeblocks', entre as escolhidas.