Ainda não tem a nossa APP? Pode fazer o download aqui.

Alive num paraíso Celeste de soul

Jorja Smith foi igualmente gigantesca no palco principal.

Alive num paraíso Celeste de soul

Foi um belíssimo início de noite da melhor soul britânica no Palco NOS do NOS Alive, ao som de duas das suas melhores representantes atuais: Celeste (na foto) e Jorja Smith. As formas como mostram esses talentos é que são substancialmente diferentes. Celeste projeta mais a sua voz, Jorja Smith prefere a suavidade.

Ainda com o sol a roçar a linha de horizonte, Celeste apresentou-se de luvas e com um vestido de riscas diagonais, uma cintura que parecia uma bóia e umas enormes e lindíssimas botas. A sua soul é igualmente glamourosa, acompanhada por um octeto com uma musicalidade que permite uma transição entre músicas indistinta.  

Celeste cumpriu à risca o alinhamento do concerto de Glastonbury, com 12 músicas e uma dose muito moderada de temas do seu único álbum de originais, Not Your Muse. Com uma voz imaculada que nunca falha, apesar de todos os riscos dos esticões, a cantora passou metade da sua atuação de 55 minutos junto ao público, ora descendo os degraus do palco, ora fazendo um percurso muito fotogénico no fosso central que divide a arena em duas metades. Para a ver, era preciso olhar para uma das telas laterais, mesmo estando-se perto do palco.

Celeste aproxima-se de perto de várias das iconografias da soul e do jazz. Em Tell Me Something I Don't Know, testa uma projeção de voz à Aretha Franlin. Em Love Is Back, justifica as comparações com Amy Winehouse. No final, quando interpreta Brings Me Back To You e Strange, quando encurta a intimidade entre almas com o acompanhamento somente do violoncelo e do piano, faz uma tangente à classe solene de Billie Holiday. 

 

Cortejada por um septeto composto por um trio de coros, Jorja Smith lançou cedo algumas das suas maiores cartadas como Be Honest ou Addicted. Mas mesmo que só com uma hora para mostrar o seu valor, a cantora não teve pressas festivaleiras, desapressando-se numa soul mais sussurrada,, sem forçar a dicção e a dobragem das sílabas. A sua música tem mais camadas de modernidade do que Celeste, sem puxar pela electrónica e sem expor demasiado a voz. Os seus olhos húmidos brilhavam nas telas, o seu rosto calmo e melancólico serenava tanto quanto a sua música.

Sugerindo classe em vez de a impor, a sua música foi entranhando ao longo de uma hora, sem precisar de arrasar. Torna-se difícil escolher momentos altos. Time, preparada por um solo da sua baterista, é soul mimosa e aconchegada. Blue Lights justifica o título, cintilada pelo dedilhado dos teclados, com Jorja Smith a ganhar uma fluidez de soltura de versos típica de uma rapper. A canção cola-se como um díptico a Come Over, antes do encerramento com On My Mind. Foi um deslumbrante final de um deslumbrante concerto, que dificilmente será esquecido por quem o viu.

 

Os Quatro e Meia abriram o palco principal. O sexteto nacional de formação em Coimbra conseguiu o feito de tocar uma hora de fato e gravata debaixo deste calor. Mostraram-se bem rodados, diante de um público com mais fãs do que se poderia imaginar, reagindo efusivamente a temas como Baile de S. Simão, Bom Rapaz, A Terra Gira ou Olá Solidão. A banda agradeceu a oportunidade de tocar naquele palco grande de um festival da dimensão do Alive. Ao fim de 55 minutos em palco, despediram-se com uma foto de família com o público atrás.


No Palco Heineken, a uma hora mais tardia e com mais espaço do que é normal, a londrina Nilüfer Yanya fez uma demonstração eloquente de que é um dos maiores talentos indie da atualidade. O naipe de canções vindo do recente álbum "Painless" serviu de base para a sua atuação, confirmando um lugar muito próprio e diferenciado para a sua expressão rock, com as suas flutuações elegantes de voz e umas garras felinas a atacar a guitarra elétrica com destreza e inventividade. A forma crua de tocar lembra a PJ Harvey dos primeiros álbuns. E não é que Nilüfer Yanya enfrenta a referência de frente como um forcado a um touro, fazendo uma versão de Rid of Me que reforça a sua assinatura individual, incrementada pelos sopros da sua saxofonista, Jazzi Bobbi. Nilüfer Yanya foi sendo acompanhada por três instrumentistas. Mas podia não ter banda que brilhava na mesma. Foi a sensação que deu no seu concerto de uma hora no Palco Heineken.

 

Notas escritas sobre Nilüfer Yanya acrescentadas no dia seguinte, a 8 de julho.