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Evanescence sombrios mas otimistas

Concerto no Campo Pequeno assinala regresso da banda a Portugal dez anos depois.

Evanescence sombrios mas otimistas

Lá fora, a noite era de dilúvio em Lisboa. As muitas ruas alagadas, a força da chuva incessante e algumas vias fechadas a túneis por prevenção, bem próximo do Campo Pequeno, fizeram do trajeto até à sala de espetáculos, onde os Evanescence iriam atuar, uma autêntica peregrinação, daquelas que implicam sacrifícios.

Lá dentro da sala, a chuva não se ouvia. O palco dos Evanescence era largajão e contava com um pódio, debaixo de uma estrutura luminosa em aranha. Atrás, faiscava um ecrã triangular. 

Como lembra a simpática vocalista Amy Lee no primeiro dos seus discursos para o público, este concerto marcava o regresso dos Evanescence a Portugal dez anos depois. Com os seus longos cabelos pretos e as suas roupas escuras, Amy Lee encarna a alma do grupo, com o seu ar sombrio mas com uma disposição otimista.

Os alongamentos vocais e o confronto direto com o público cabem a ela. O estardalhaço elétrico é da incumbência do segundo membro mais importante da hierarquia do grupo, o guitarrista principal Troy McLawhorn. Percebe-se quando cada tema vai aquecer mal Troy McLawhorn sai do fosso de apoio lateral, sobe a escada para o palco, abre as pernas e posiciona a guitarra horizontalmente para mais umas explosões rockers e mais uns quantos abanões da guedelha. O ritual repete-se quase a cada música. No restante quinteto, Emma Anzai é o único membro recente, mas passa por antigo.  

À quarta música, o termómetro do Campo Pequeno aumenta ao som de  'Going Under', com Amy Lee a puxar da sua voz de monstro gótico, com o intermitente Troy a ter os seus 15 segundos de solo de guitarra e com a baixista Emma Anzai a mostrar-se nos coros. 

O contexto sonoro muda radicalmente com a balada 'Wasted on You', com Amy Lee a cantar nos teclados no piso superior, até descer e fazer as suas passeatas com headbanging à mistura. Até o drama vocal de Amy Lee ganha garras rock, com o auxílio das erupções da sua banda. 

Um dos momentos mais ovacionados acontece depois com 'Far com Heaven', com Amy Lee sentada ao piano de cauda, a cantar a balada, enquanto os sintetizadores atrás substituem o que seria para o caso uma bem-vinda orquestra. A nível de deslumbramento mais visual, o tema bafejado é 'The End of the Dream', em que Amy Lee sobe ao cimo do palanque do palco, e forma ela própria uma mancha negra à frente de um clarão de um planeta, como se ela fosse um corvo. Depois, um bando de aves negras fazem o seu bailado nos céus.

Muito dada a discursos, Amy Lee a determinada altura faz lembrar aquele momento do Presidente norte-americano JF Kennedy, quando este desafia os seus cidadãos a questionarem-se sobre o que eles poderão fazer pelo país e não o que é que o país poderá fazer por eles. Amy Lee diz mais ou menos isso por outras palavras, como lançamento do tema 'Use Your Voice', enquanto circulam imagens de apoio à Ucrânia e o público da bancada se mantém sentado, apesar dos sentimentos à solta. 

Numa espécie de encore, Amy Lee Volta sozinha a palco, pega na bandeira LGBT e expõe-a à frente da bateria. É sozinha que começa a cantar 'My Immortal', que segue um crescendo de intensidade que requer a adesão do resto da banda. 'Bring Me to Life' é o assalto final às almas presentes, depois de quase hora e meia de espetáculo. Num filme já visto noutras bandas, Amy Lee hasteia a bandeira da República Portuguesa, debaixo de uma onda de confetti.