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Oceanos: Muitas leis e objetivos, poucos resultados

As respostas aos problemas que os oceanos enfrentam vão estar no centro das discussões na segunda Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, que se realiza entre 27 de junho e 01 de julho em Lisboa.

Oceanos: Muitas leis e objetivos, poucos resultados
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Nos últimos 60 anos foram aprovadas dezenas de medidas internacionais de proteção dos oceanos e só Portugal aprovou centenas de ações de defesa do mar, mas a ONU insiste que os oceanos estão doentes.

As respostas aos problemas que os oceanos enfrentam vão estar no centro das discussões na segunda Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, que se realiza entre 27 de junho e 01 de julho em Lisboa e que é, segundo a própria ONU, uma oportunidade para um apelo à ação para “reverter o declínio na saúde dos oceanos”.

Os problemas dos oceanos, sendo um dos mais mediáticos a poluição por plástico, não se devem aparentemente a falta de legislação. Só Portugal aprovou objetivos de sustentabilidade relacionados com o setor do mar que totalizam, tendo em conta medidas e leis internacionais, centenas de ações que pretendem proteger e recuperar os oceanos até 2030.

A nova Lei de Bases do Clima, que entrou em vigor em fevereiro, faz referência aos oceanos no artigo 55, afirmando que “o Estado promove atividades de pesca e aquicultura ambientalmente sustentáveis e eficientes, prosseguindo os objetivos da neutralidade climática e da proteção da biodiversidade”.

A lei prevê combustíveis verdes ou renováveis no setor da pesca, a redução de resíduos marinhos e o aumento da qualidade das águas, e uma gestão sustentável dos ecossistemas marinhos, da pesca e da aquicultura.

E preconiza a criação de áreas marinhas protegidas, o estímulo à produção elétrica através de energias oceânicas e em alto mar e ações de restauro ecológico de ecossistemas costeiros e marinhos, incluindo sapais, pradarias de ervas marinhas, recifes rochosos e florestas de algas.

A lei está mais focada no clima e menos nos oceanos. Para o oceano foi aprovada no ano passado a Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030 (ENM 2021-2030), que traça o rumo da política pública do mar para a presente década e pretende atuar na proteção do oceano, na valorização dos serviços dos ecossistemas marinhos e na sua importância para o desenvolvimento sustentável e a economia azul, tudo alinhado com a Agenda 2030 das Nações Unidas, com o Pacto Ecológico Europeu, com a Política Marítima Integrada da União Europeia, com a Política Comum de Pescas e com outros documentos estratégicos da União Europeia.

A ENM 2021-2030 completa-se com um Plano de Ação da ENM 2021-2030, que inclui 185 medidas concretas, 30 das quais são consideradas emblemáticas, divididas por 10 objetivos estratégicos.

Incluem mapeamento dos 'habitats' e ecossistemas marinhos e costeiros, a classificação como áreas protegidas de pelo menos 30% das águas marinhas sob jurisdição nacional, tornar o setor da pesca dos mais sustentáveis a nível mundial, ou apostar na aquicultura e dessalinização sustentáveis.

Além da legislação portuguesa e europeia, os assuntos relacionados com os oceanos são também objeto de legislação mundial, como a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que estabelece um Tribunal Internacional do Direito do Mar, para resolver controvérsias marítimas.

A Convenção, de 1982, estende os conceitos do direito internacional aos oceanos, como a definição de “zona económica exclusiva”, “alto mar”, “plataforma continental” ou liberdade de navegação. A área da preservação do meio marinho, além da ciência, investigação e tecnologia, fazem parte também da Convenção.

Em 1960 já tinha sido criada a Comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO, um órgão das Nações Unidas ligado às ciências do mar que apoia e coordena programas de investigação marinha, a ciência e a proteção da saúde dos oceanos. Portugal faz parte da Comissão.

E pela mão da ONU foi criada a “Comissão do Fundo Marinho das Nações Unidas” (sobre armas nucleares nos mares), adotaram-se declarações de proteção de oceanos e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), através do Programa de Mares Regionais, também atua na proteção dos oceanos a nível regional. Através do PNUMA foi também criado o “Programa de Ação Global”, para proteger o ambiente marinho de atividades em terra.

Da ONU saiu ainda a Organização Marítima Internacional (OMI), que tem a missão de criar uma estrutura reguladora do setor do transporte marítimo. Através da OMI já foram adotados regulamentos sobre emissões poluentes dos navios, por exemplo, ou o chamado Código Polar (operações em águas polares).

E desde 2018 que decorrem negociações para criar um Tratado Global dos Oceanos, para proteger as águas internacionais fora de jurisdições nacionais, em pelo menos 30% da superfície marítima global até 2030.

O Tratado poderá ser um instrumento de proteção de ameaças além das fronteiras dos países como as alterações climáticas, a exploração de hidrocarbonetos, a pesca em excesso, a mineração ou a poluição, mas em quatro anos não foi possível chegar a um consenso e em março, numa reunião em Nova Iorque, os países da ONU voltaram a falhar um acordo, colocando a nu a falta de tradução em ações concretas do vasto volume de legislação existente.

Uma nova tentativa poderá ser feita na Conferência dos Oceanos em Lisboa, a segunda, depois de uma primeira na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, em junho de 2017. Ambas com o objetivo de inverter a tendência de destruição dos oceanos.

O enviado especial do secretário-geral das Nações Unidas para o Oceano, Peter Thomson, em declarações recentes à Lusa, disse que a conferência de Lisboa será decisiva para o futuro dos oceanos e o momento crucial para mobilizar esforços para “travar o declínio da saúde dos oceanos”.

Os oceanos são responsáveis pela produção de metade do oxigénio do planeta e a sua importância foi salientada no último relatório do Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC, na sigla original), divulgado em março, segundo o qual a manutenção dos serviços ecossistémicos depende da conservação real de entre 30% e 50% das áreas terrestres, de água doce e dos oceanos do planeta.

Os oceanos, origem das primeiras formas de vida no planeta há 2,5 milhões de anos, fonte de alimento de milhões de pessoas, cobrem cerca de 71% da superfície da Terra.

As Nações Unidas declaram a presente década como a “Década da ONU da Ciência dos Oceanos para o Desenvolvimento Sustentável 2021 – 2030”, para que a ciência dos oceanos possa apoiar as ações dos países para gerir os oceanos de forma mais sustentável.